sexta-feira, novembro 09, 2018

Patético romance

Ele tinha um jeito de me fazer sentir a pessoa mais interessante do mundo, como se ele me dando toda a atenção, eu tivesse inserida em um novo universo em que todo assunto passível de interesse só poderia ser proferido pelos meus lábios.
Conversava olhando tão profundamente em meus olhos, que se perdiam no azul marinho dos seus, que eu quase podia me sentir afogando.
E não havia assunto abordado que lhe era estranho. E nem palavra que eu falasse que ele não admirava sendo pronunciada.
Suas sobrancelhas faziam um vinco no meio e mostravam a seriedade com que encarava o fato de que eu estava falando. Até os chiados da minha pronuncia péssima, ele gostava de ouvir.
Eu estava me afogando num mar de luxuria, a unica coisa que me fazia voltar era o vento incessante que assobiava quando passava pelos meus cabelos e sacudia meu corpo já bem resfriado pelo fim de primavera daquele dia.
Então ele começou a falar. Sua voz grave e levemente rouca me fazia vibrar como um vidro vazio e me preenchia com sensualidade.
Era um assunto qualquer que eu nem me lembro, mas usávamos nosso melhor vocabulário quase como que para impressionar um ao outro, algo totalmente desnecessário pois estávamos deslumbrados um com o outro. Eu nem sabia que existia no mundo homens assim, que se interessam tanto pelo o que uma mulher pode dizer. 

Desci lentamente minha cabeça até seu ombro e senti um calor me invadindo, vindo diretamente de seu corpo. Percebi que foi pego de surpresa pois houve uma pausa inesperada na frase que dizia na hora. E as pernas que estavam cruzadas foram soltas, a mão direita pousou suavemente em minha coxa. 


Então depois houve uma pausa longa. 

Não precisávamos de palavra alguma. O cheiro dele me inebriava e o leve repousar de sua mão em cima de minha coxa fazia eu sentir uma especie de corrente eletrica que passeava por todo o meu corpo, prevendo algo. 

Levantei a cabeça e olhei bem em seus olhos, e então fui invadida. 

Sua mão antes sobre minha coxa me puxava para si pela jaqueta que eu vestia, e a outra enlaçou minha cintura, tudo absolutamente devagar e sensual. Eu queimava, porque me bastava. Eu sabia que iria queimar junto dele e inebriá-lo com meu calor. 

Terminamos o primeiro ato num quarto de hotel sem nome com a sensação de que nos conhecíamos há mais de um século e um sorriso imutável na boca, mesmo que aquele ato não significasse nada para nós na hora seguinte em que cada um entrava em seu veículo e seguia para lugares totalmente diferentes como os dois estranhos que éramos. 


Les Amants - 1928 - Magritte
*Esta é uma obra de ficção, qualquer semelhança com nomes, pessoas, fatos ou situações da vida real terá sido mera coincidência*